Entrevista a Ellen Johnson-Sirleaf, Presidente da Libéria

Chefe de Estado da Libéria, a única mulher a comandar um país da África imagina como seria um mundo com as mulheres no poder. Deborah Solomon/NYT, postado no blogue de Geledés). Como única mulher a ocupar o posto de chefe de Estado na África, qual é a sua opinião sobre o recente documentário “Manda o Diabo de Volta para o Inferno” (Pray the Devil Back to Hell, 2008) que credita às mulheres da Libéria todo o fim da sangrenta guerra civil daquele país?Ellen Johnson-Sirleaf: Assisti ao documentário e aplaudo as mulheres que enfrentaram chuva e sol para promover a paz, defendendo a reconciliação e o final da guerra. Gosto de dizer que nosso país deve muito a elas. Sua posse, em janeiro de 2006, foi como a realização de um sonho feminista. Ellen Johnson-Sirleaf: As pessoas não pensavam que isso aconteceria na Libéria, pois somos um país pobre, devastado pela guerra e que, na opinião delas, precisava de um machão. Mas as mulheres mostraram que era diferente, e devo dizer que espero que estejamos provando que essas pessoas estavam erradas. Ao viajar pela África no início do mês, inclusive com uma parada em Monrovia, capital da Libéria, Hillary Clinton foi veemente ao reclamar sobre a epidemia de estupros no leste do Congo. Esse é um problema que também assola a Libéria? Ellen Johnson-Sirleaf: Com certeza esse é um grande problema na Libéria. E isso continua acontecendo por uma única razão: existe uma cultura do silêncio em razão da vergonha das famílias. Sim, em um caso recente em Phoenix, estado do Arizona, uma refugiada da Libéria de oito anos de idade foi estuprada por quatro garotos liberianos e os pais da menina a deixaram trancada do lado de fora de casa. Ellen Johnson-Sirleaf: Pedimos para que nosso embaixador intercedesse junto à família da menina para que ela ficasse em um abrigo de proteção por algum tempo. Também achamos que os garotos precisam de acompanhamento psicológico, pois ao longo dos anos de guerra, a moral, a disciplina e a legalidade se desmoronaram – fazendo com que garotos se tornassem homens antes do tempo. O que isso representa em relação ao caráter inerente ao homem? Ellen Johnson-Sirleaf: Eu só acho que, a menos que você tenha uma unidade familiar bem coesa, o caráter masculino tende a se tornar muito dominante, repressivo e insensível. Muito disso ocorre também devido à falta de escolaridade. À medida que mais homens começam a ter um nível escolar mais alto, e mais mulheres têm acesso à educação, o sistema de valores tem de ser aprimorado e o respeito à dignidade humana se torna melhor. Qual é o índice de alfabetização de seu país? Ellen Johnson-Sirleaf: Fico triste que o índice de alfabetização não passe de 30 por cento. Apesar de sua popularidade no exterior, em seu país você foi denunciada por sua associação ao ex-presidente Charles Taylor, que está sendo julgado no Tribunal Internacional de Haia por assassinato, estupro e pelo uso de crianças como soldados. Eu presumo que você tenha rompido com ele. Ellen Johnson-Sirleaf: Já faz muito tempo. Depois de seis meses dentro de seu movimento eu percebi que suas intenções estavam erradas e desde então venho lutando consistentemente contra ele. Você pretende convidar o presidente Obama para visitar a Libéria? Ellen Johnson-Sirleaf: Tenho certeza de que ele sabe que todos os países africanos, inclusive a Libéria, têm um convite para ele. A população simplesmente o adora. Fico muito surpresa – às vezes estou dirigindo e vejo o Mercadinho Obama ou o Armazém Obama. As pessoas abriram lojinhas e puseram o nome dele como homenagem. Qual é o seu salário como presidente? Ellen Johnson-Sirleaf: Recebo US$ 7.500 por mês. Qual é o salário médio de um funcionário público liberiano? Ellen Johnson-Sirleaf: Ele agora foi aumentado para um mínimo de US$ 80 mensais. Se as mulheres liderassem o mundo, as guerras ainda existiriam? Ellen Johnson Sirleaf: Não. O mundo seria melhor, mais seguro e mais produtivo. A mulher daria outra dimensão a essa tarefa e isso tem a ver com a espécie humana – tem a ver com o instinto materno. Mas, se as mulheres tivessem o poder, elas seriam mais propensas a adquirir os traços negativos que o mesmo alimenta – como o orgulho e o territorialismo. Ellen Johnson-Sirleaf: Levaria um período realmente longo de mulheres no poder para chegar-se ao ponto delas se tornarem homens. Em sua opinião, porque nunca tivemos uma mulher na presidência dos Estados Unidos? Ellen Johnson-Sirleaf: Tenho de que perguntar isso a vocês. Vocês é que têm de votar nelas.

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