*Eliana sonha em ser Alice
Por Cidinha da Silva

Eliana era bonita como um copo de leite. Sonhava em ser Alice enquanto vendia balas no sinal. Os motoristas a olhavam surpresos e consternados.

Os pais de Eliana estavam sempre por perto. A mãe cuidando dos dois menores, de 3 e 4 anos, talvez. O pai lavando o vidro dos carros, um olho na filha, outro no rodinho com sabão.

Já tinha vindo até jornalista fazer matéria de TV com Eliana e sua família. O pai, Constantino Zykzyz, era colono em Santa Catarina. Perdera a parceria da terra para o fazendeiro. Foi convidado a ingressar num movimento de trabalhadores rurais sem terra, mas temeu a dureza do dia a dia das ocupações. Juntou a família e preferiu tentar a vida no concreto de São Paulo. Não conseguiu trabalho, pois só sabia plantar. Por sorte, um conhecido lhe indicou um movimento de citadinos sem teto e ele conseguiu um quarto naquela ocupação de prédio no centro da cidade.

Eliana queria estudar. Eles, os pais, também queriam que ela estudasse, mas a beleza da menina era fascinante demais e eles foram aconselhados a deixá-la na vitrine da rua à espera da chance de ouro. Mais cedo ou mais tarde passaria alguém da TV por ali e a convidaria para ser modelo infantil, na certa. Era só confiar e perseverar.

Já estão ali há dois anos e nenhum convite veio. Eliana tem 8 anos e ainda não foi à escola. Sabe ler o que a mãe ensinou. O problema maior é que sua pele de copo de leite começa a se confundir com a fumaça dos carros e os sinais do tempo da infância perdida aparecem a cada dia. Daqui a pouco, será apenas mais uma menininha do semáforo que sonha em ser Alice.

*Eliana sonha em ser Alice é crônica integrante do livro OH, MARGEM! REINVENTA OS RIOS!- sessão de autógrafos amanhã, dia 9 de junho de 2012, na Casa das Rosas (Paulista, 37).



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