Acervo do Muquifu e excertos de Cidinha da Silva em Pádua, 2014
Burrinho
O
dono do burrinho não tinha nada antes de tê-lo. Era um menino sem
perspectivas que carregava sacolas no mercado, sacolas grandes, quase
maiores que ele. Um dia uma senhora teve pena do menino e o levou para
casa. Dava-lhe umas sobras de comida, de
cadernos e lápis, roupas usadas e desprezadas pelos filhos. Mas
qualquer coisa tinha valor, diante do imenso nada da vida do menino. Em
outro dia na vida do menino, já rapaz depois de muitos anos de serviços
prestados, a madame lhe deu um burrinho de pata quebrada, que pelas mãos
de uma irmã chegou ao Muquifu, junto com essa memória de exploração
humana e uma pata consertada pelo novo dono.
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
Foto: Augusto de Paula
Folia de Reis
Se
minha Ana revivesse a viola voltava a tocar. Se Deus não tivesse levado
ela, a viola chorava de alegria, mas depois que ela não está mais aqui,
nem gemer de tristeza a viola geme. A fala dela é silêncio, encostada
na parede. As mãos e o rosto do violeiro
estão secos, não precisam mais das toalhas. Eu vou emprestar os
instrumentos para o Muquifu, padre, o senhor não leve a mal. Quem sabe
um dia a Folia volta...
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
A Gaiola
A
gaiola vazia do colecionador é metáfora da liberdade: daquilo que não
está mais preso, da vida que escapou para voar, de agrupar e guardar o
que para outros não tem mais utilidade, mas, para ele poderá fazer
sentido um dia.
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
Boneca
A
mãe, quando criança não conseguiu ter a boneca dos sonhos. Encontra-a
num brechó e compra-a para a filha. Canta para si mesma a mais bela
canção de ninar que as próprias mãos puderam prover.
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
Foto: Augusto de Paula
A Igreja
A igreja da infância tinha duas torres, duas janelas laterais, uma
porta central e um relógio acima dela. O sino batia a cada hora cheia
marcada no relógio e a cada dia vivido as badaladas da memória
revigoravam aquela imagem. Então ela se
materializou nesta pequena escultura em madeira e depois tornou-se uma
peça grande, edificada na fachada da sala de estar da casa do dono, para
que qualquer visitante da casa entrasse na igreja que sempre morou
dentro dele.
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
Texto: Cidinha Da Silva
Foto: Augusto de Paula
Comentários