Mais sobre o funk

(Deu na Bravo, por Gabriela Rassy, em janeiro 2009). "Quando se fala em funk carioca logo vem à mente a imagem hoje já estigmatizada de baixa qualidade artística, pornografia e incentivo ao crime. As razões desse preconceito são simples: boa parte da produção musical com a batida do funk não é divulgada, o ritmo ainda sofre muito preconceito e os MCs e DJs mal conseguem trabalhar por restrições da lei. Segundo uma pesquisa feita pelo Instituto FGV Opinião, da Fundação Getulio Vargas, o funk movimenta R$ 120 milhões por ano só no Rio de Janeiro. A realização de bailes, no entanto, é restringida devido a uma lei fiscalizadora criada em maio de 2008 pelo ex-deputado Álvaro Lins, hoje cassado. Ela faz uma série de exigências que inviabilizam a realização das festas, entre as quais a necessidade da autorização por parte de um comandante de polícia. Os recentes projetos de lei redigidos pelo deputado federal Chico Alencar (PSOL-Rio) e pelos deputados estaduais Marcelo Freixo (PSOL-Rio) e Wagner Montes (PDT-Rio) pretendem tornar o funk uma manifestação cultural popular oficial e, assim, permitir o trabalho dos profissionais da área. Os projetos, no entanto, não anulariam os efeitos da lei de Lins, mas garantiriam uma mudança de eixo no tratamento dado pelo governo ao funk. O ritmo passaria a ser lidado no âmbito da política cultural. "O objetivo do projeto de lei é mais pedagógico do que legal, apenas fomenta a discussão, leva o debate ao governo, à imprensa. A mudança prática, com a lei aprovada, seria que a polícia não poderia mais impedir os bailes e festas", explicou Freixo, que pretende fazer emendas para modificar a lei de Lins. A situação dos profissionais do funk foi levada aos deputados pela Apafunk (Associação de Profissionais e Amigos do Funk), liderada pelo MC Leonardo, autor do Rap das Armas, que está na trilha sonora de Tropa de Elite. "O funk já está no calendário cultural da cidade e turistas procuram os bailes. Se não existem mais bailes, é por que muitos produtores são impedidos de trabalhar. Cultural o funk já é, queremos apenas legitimá-lo", disse o MC. Segundo o MC, o funk emprega 10 mil pessoas e isso equivale ao número de trabalhadores do ABC Paulista. "Não podemos fechar os olhos pra esses números", argumenta. "A política coloca a polícia contra os agentes culturais alegando que a linguagem da favela é criminal. Falam que é proibido o que a gente vê e o que a gente sente. Isso é censura", considera o MC. A antropóloga e docente da UFF (Universidade Federal Fluminense), Adriana Facina, acredita que a lei não tem o poder de mudar radicalmente a situação do funk. "A lei vai garantir que os trabalhadores tenham seus direitos garantidos. Ela não acaba com o preconceito, mas vai fazer com que ele não se traduza em perseguição policial e não impeça os jovens de trabalhar", disse. A necessidade de uma lei, no entanto, ainda é questionável. O jornalista Silvio Essinger, autor do livro Batidão - Uma História do Funk tem ressalvas. "O funk virou o que é mesmo com a perseguição policial e sofrendo todo tipo de ataque. Hoje ele é uma música original, referência para turistas europeus e americanos, que querem conhecer esse tipo de baile, que não existe em outros lugares do mundo", disse Essinger. O jornalista acredita no valor estético do funk que é feito fora do esquema das gravadoras e rádios, cujo ritmo é, segundo ele, genuinamente brasileiro, cheio de miscigenações. 'Não tem funk de laboratório, não tem jabá, não tem manipulação. Não sei o quanto essa lei pode beneficiar uma coisa que funciona tão bem, mas eu acho válido tudo que puder dar uma garantia de trabalho pra quem lida com o gênero', disse".

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