Sobre a poesia do Ricardo Aleixo

(Por: Manoel Ricardo de Lima; para ler o artigo completo - Um céu inteiro para nadar -, vá ao blogue do Ricardo Aleixo). "Certa leitura da poesia produzida no Brasil tende a uma espécie de padronização crítica “carioca” (sim, assim mesmo, entre aspas, claro), o que tende a uma repetição da geografia dos usos de Machado de Assis, algo entre a Glória e o Aterro, não tão mais longe que isso (...) E é o próprio Ricardo Aleixo, agora, ao publicar na coleção Elixir (num convite do designer gráfico Flávio Vignoli e com uma tiragem de 220 exemplares) o seu último livro, intitulado “Céu Inteiro”, quem aponta para um gesto que produz um desaparecimento desses lugares marcados, amém, e desses sintomas descompassados, coisa que sempre fez desde o seu “Trívio” até o seu “Máquina Zero” e, principalmente, no seu empenho político com o mundo para ampliar a distância, com a poesia, com as pessoas ao redor, que vai desde suas posturas – não abrir mão de tomar sentido e se posicionar, assumir a fala como um dizer e não como um escorrego nem muito menos como uma “articulação” ou uma “negociação”, como ainda sugere Heloísa Buarque – até, mais recente, com o seu LIRA (mais um destes espaços de afeto, lugares encantados, que este país produz sabe-se lá como, tal qual o Alpendre, em Fortaleza, o Torreão, em Porto Alegre etc). O LIRA, esticando o passo e a distância deste “Céu Inteiro”, no bonito bairro de Santa Teresa, em Belo Horizonte, perto da antiga esquina do Clube com suas canções sem tamanho, é um desdobramento de uma política de afetos. “Céu Inteiro”, então, é um livro magro, curto e delicado, folhas soltas dentro de uma suposta pasta cinza, com uma letra bordô, uma ferrugem dobrada ao meio numa linha de elástico vermelho usada para fechar e abrir a caixa. É um livro-parte de um projeto maior que vai se chamar “Modelos Vivos”. O livro foi feito numa recuperação da tipografia, a poesia em tipografia (como o gesto de Cleber Teixeira e sua Noa Noa), cinco lipogramas como as novelas de Lope de Vega das quais retira de cada uma delas uma vogal. E assim faz Ricardo,a cada poema uma ausência de uma das vogais. No canto das páginas, elas aparecem, uma a uma, como uma numeração, como uma rememoração das vogais de Rimbaud, como um outro poema, um poema de canto de página, de salto para fora, de silêncio e tremor. E assim começa o movimento desta afecção: “Céu inteiro. Do centro dele, pende o / velho sol, o que viu surgir o primeiro // dos nossos, o último. Tudo de que me / recordo: um sítio onde o único rumor // que se ouve é o gorjeio monótono dos / grous. Noite de breu, de negrume, liso // de pele de bicho com, é possível, o / mundo inteiro sob seu peso feroz. Seus // duplos. O medo, como é: o vulto oblíquo / de um olho cego entrevisto por dentro.” Ver por dentro, no vazio da placa de desvio, a caixa dentro da caixa como parte da queda, tudo passando aos saltos, num próximo segundo, sugestões de Ricardo Aleixo para a poesia, para ler a poesia como uma responsabilidade e não como quem pendura as mesmas fotografias nas mesmas paredes limpas, claras e fixas. A poesia, para Ricardo Aleixo, vem como desapropriação e com um céu inteiro para nadar".

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