O livro de Capulanas, Cia de Arte Negra
Por Cidinha da Silva
(Em) Goma dos pés à cabeça, os quintais que sou é resultado coletivo da
reflexão de vários produtores de arte envolvidos e liderados pelas quatro
artistas da Cia Capulanas de Arte Negra.
Na apresentação do livro e do trabalho, Adriana Paixão, Débora Marçal,
Flávia Rosa e Priscila Preta nos contam que o espetáculo Pé no quintal,
documentado no livro, “veio de forma singela desmistificar o nosso ‘pé na
cozinha’ e colocá-lo onde toda nossa cultura foi desenvolvida, nos terreiros de
saberes, espaço comum a todos, lugares de sambas e versos, cantos e passos e
das grandes rodas de jongo que cantavam nossa liberdade.” A perspectiva do grupo é de realizar o que
chamam de deselitização da arte e voltar à ancestralidade negra.
Proposta consistente e de leme seguro que as fez visitar cerca de 30
quintais, incluindo alguns em Maputo, Moçambique. A proposta de levar a arte
feita por mulheres negras de periferia para as periferias de São Paulo
floresceu como se vê nos depoimentos contidos no livro e DVD encartado.
O relato pessoal de cada uma das integrantes da Cia Capulanas permite-nos
conhecer um pouco do lugar de onde cada uma emite a voz e como essas vozes, em
conjunto, definem o canto do grupo.
Dentre as reflexões dos colaboradores, destaco a dos diretores de teatro
Julio Moracen e Lucrécia Paco, que muito acrescentam a quem quer
conhecer/compreender premissas e práticas do teatro negro.
O livro (Em) Goma é a documentação do processo. Embora pareça que
Capulanas valorize muito mais a reação de crianças que, depois de
assistirem/participarem do projeto Pé no Quintal, passaram a se referir às
Pombagiras como rainhas, elas sabem que o registro em livro e DVD é também fundamental
para construir a memória do caminho estético eleito.
Mas, o que mais me toca, de fato, é o entendimento do potencial
transformador da arte, vivo e
revitalizador, demonstrado por Capulanas. É mais uma cena do forte movimento de
teatro negro levado a termo, por elas, pelos Crespos, Quizumba e Coletivo
Negro, todos em São Paulo. Trabalhos e propostas artísticas que têm à frente
jovens negros, sem líderes mais velhos e consagrados, dos quais sejam meros
seguidores. Essas dançantes-atrizes de Capulanas são as timoneiras do barco, ícones
para outras mulheres jovens, espelho para as mais velhas.
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