Os técnicos do Supremo, das seleções de vôlei e de futebol
Por Cidinha da Silva
Dosimetria era uma expressão desconhecida para mim até vê-la utilizada na
dosimetria das penas do mensalão. E olha que volta e meia sou acusada de falar
difícil. Aprendi com o STF
que dosimetria é a forma como são calculadas as penas para os crimes, considerando
fatores agravantes e atenuantes, entre outras informações.
Ayres Britto, Presidente da casa, num gesto simpático e
espirituoso com os leigos seguidores do julgamento do século (insisto que a
Comissão da Verdade deveria fazer dobradinha nessa adjetivação), dia desses
criou o verbo dosimetrar: eu dosimetro, tu dosimetras, ele dosimetra... Visível
era seu interesse em facilitar o entendimento de quem, como eu, desconhece as miudezas
da linguagem jurídica.
Existem questões, conhecimento e linguagem extremamente
técnicos utilizados em julgamentos como esse. E havemos de confiar no saber que
esses homens e agora também, mulheres, passaram décadas construindo. É óbvio
que, ao afirmar isso, não pontifico que estes juízes e juízas sejam
senhores da razão, do bom senso e da justiça, haja vista a decisão do Ministro
Gilmar Mendes, desfavorável aos índios Guarani Kaiowá de Mato Grosso do Sul,
dentre centenas de outras. O Ministro tem (ou deveria ter) competência técnica
para avaliar o tema, está no STF para fazê-lo. Pode ser que ele não tenha ética,
sensibilidade política e humana, noção de direitos dos povos tradicionais, mas
contra isso, agora que o STF está na vitrine da opinião pública, temos a força
popular para pressionar e forçar a revisão da decisão.
Por outro lado, foi também no STF que o Ministro Joaquim
Barbosa, silenciosamente, à revelia dos holofotes do mensalão, negou ao goleiro
Bruno o pedido de relaxamento de prisão pela morte de Elisa Samúdio, decidindo
não conhecer um recurso apresentado pela defesa do ex-goleiro, ou seja, não
analisar o mérito do pedido, por não haver nada de novo a ser analisado.
Mas a questão central que me interessa aqui é como muita
gente tem agido com o STF no caso mensalão, de maneira similar ao jeito de
olhar a Seleção Brasileira de Futebol. Todo mundo tem na cabeça e até no papel,
a melhor escalação para vestir a Amarelinha e o técnico mais eficaz para
dirigi-la, obedecendo aos desígnios do técnico-povão, por suposto.
Tal atitude popular independe do fato de a CBF ser uma
instituição pouco confiável, para dizer o mínimo. É que a gente se acha dona da
verdade, entende de futebol como ninguém e o Mano é burro, lógico. Não nos
interessa a competência técnica dele, seu histórico como treinador, nada disso,
Mano é burro e pronto! Como qualquer técnico da Seleção o será em algum
momento.
A solução para o problema é a respostabilidade do Tite em campo, o
espírito trabalhador do Muricy, os times bem armados e pragmáticos do Abelão, até
o Luxa, estrategista dos anos 90, queremos de volta. Qualquer um salvará a
Seleção, menos o Mano.
Com as Seleções Brasileiras de Vôlei, feminina e masculina,
nos posicionamos de maneira diferente, em que pese o fato de o jogo das
cortadas e manchetes não ser a paixão nacional representada pelo futebol e da
CBV também não ser flor que se cheire, sabido trampolim de Nuzman para o COB e
dali para a perpetuação em cargos de mando, respeitamos os técnicos escolhidos.
Bernardinho realiza concorridas oficinas de aprimoramento profissional para um
grupo seleto de técnicos aspirantes a top,
nos períodos entre o final de um campeonato e início do outro. Zé Roberto decide
cortar uma jogadora importante, deixa de convocar outras e isso não abala a
imprensa esportiva, mais racional quando o tema não é o jogo com os pés. Há certo
consenso de que ele sabe o que é melhor para o time e é a pessoa certa para
aquele lugar.
Na persona de Zé Roberto cabe um parênteses, me agrada muito
aquela cara de feliz que ele tem. Aquele jeito de dizer ao mundo: O Bernardo é
o máximo e eu não o invejo, eu sou feliz! Parece o Messi, para quem ser um
homem correto e um ótimo pai é mais importante e desafiador do que ser o melhor
jogador do mundo.
O caso é que tem gente tratando o STF como trata a Seleção
(de futebol), quero dizer, desprezam todo o conhecimento específico de comissão técnica e jogadores convocados.
O que vale são as próprias soluções, indicações, escolhas de cada um dos
milhões de técnicos de futebol espalhados pelo povo brasileiro.
Particularmente, prefiro ver o STF como um primo dileto da
Seleção de Vôlei. Confio nesse grupo renovado que não é composto por relações
de compadrio e parentesco. Confio em sua competência técnica para julgar. Quero
acreditar no compromisso ético de cada integrante do Supremo para consolidar
uma instituição séria e isenta. E, se errarem, que exijamos revisão, como
faremos com a sentença de Gilmar Mendes, contrária aos direitos dos Guarani
Kaiowá.
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