Escritoras negras, nós e caminhos!
Por Cidinha da
Silva
Minha editora,
Charô Lastra, pauta um texto sobre mulher negra e literatura, como objeto e
como sujeito literário, para a blogagem coletiva sobre mulheres negras, com o
objetivo de aproximar o Dia da Consciência Negra e o Dia Internacional da Não
Violência Contra a Mulher.
A primeira sensação
é de que estamos bem como atrizes principais na cena, observados os limites de
um cotidiano racista, obviamente. Ruth Guimarães, nossa mais-velha, tem mais de
90 anos e continua produzindo. Geni Guimarães, com sua prosa dura e doce,
voltou a escrever, a publicar e a circular pelo mundo da literatura. Conceição
Evaristo é cada vez mais reconhecida e tem sido traduzida para outras línguas.
Mirian Alves se reinventa constantemente e dialoga com a moçada mais jovem. Ana
Maria Gonçalves publicou há alguns anos, Um defeito de cor, um dos romances
mais importantes da literatura brasileira nos últimos 40 anos. Elisa Lucinda
encanta mais a cada livro, com sua poética de amor e dengo. Carolina de Jesus,
sempre atual, tem sido relida e reinterpretada pelas novas gerações de pesquisadoras/es.
As novas
escritoras também estão com a pena leve, pondo bons textos na roda. O corpo da
mulher negra, nestes textos novos, é sexualizado pelo desejo de senhoras de
suas próprias vontades. É um corpo valorizado por suas características étnicas
e por sua forma guerreiro-amorosa de se inscrever no mundo. É contraposição
autoral e digna à velha figura da mulher negra de cama, mesa e banho, abundante
na literatura canônica.
São marcantes, a
presença da ancestralidade feminina, da religiosidade de matrizes africanas,
bem como da memória como guardiã dos saberes das pessoas mais-velhas. São
textos que recobrem expressões plurais de mulheres negras, que têm identidade,
sim, mas não abrem mão do direito à alteridade.
Outra novidade
significativa, é que interiores de becos, quebradas, periferias e favelas
ganham luz do Sol que os enegrece, projetada por escritoras, para as quais, em
substantivo número de vezes, ser negra não é a filiação identitária primordial,
mas, mesmo assim, elas têm sido efetivas em tingir de preto o lugar
geo-político-afetivo representado por criadoras negras altivas e
transformadoras.
Entretanto,
ainda pouco nos é dado a conhecer sobre escritoras negras latino-americanas e
caribenhas, para não mencionar a ausência de informação e tradução de
escritoras africanas. O que sabemos de
Maryse Condé, escritora de Guadalupe? O que conhecemos de Simone Schwarz-Bart,
também de Guadalupe, publicada no Brasil pela Marco Zero (A ilha da chuva e do
vento)? O que sabemos de Mayra Santos-Febres e Micheline Coulibay, contistas do
Caribe, apresentadas no Terras de Palavras, da Pallas Editora. Nada! Nada
sabemos sobre escritoras afro-caribenhas.
E quanto à
África, às literaturas africanas, quando despertaremos para elas? Até quando escritoras como somáli Ayaan Hirsi Ali,
autora de Infiel (Companhia das Letras, 2007) terão destaque como espécime exótico da dor
africana, servida com café e biscoitos finos nos balcões de livrarias dos
aeroportos brasileiros? Até quando Sobonfu Somé, escritora do Burkina Faso (O Espírito
da Intimidade, Odysseus, 2003), aquela que veio ao mundo com a missão
espiritual de transmitir ao Ocidente os ensinamentos sobre a vida comunitária
do povo Dagara, seu povo, permanecerá como um diminuto diamante, perdido no
cascalho das prateleiras das livrarias? Até quando os legítimos representantes
das literaturas africanas de língua portuguesa, largamente divulgados no
Brasil, serão apenas os grandes escritores Mia Couto (Moçambique) e José Eduardo
Agualusa (Angola)? Quantas Paulinas Chiziane sucumbirão à passagem atlântica do
nosso desconhecimento, até que nossos olhos se descortinem para vê-las, para
lê-las?
Creio que será
assim até que ações afirmativas sejam implementadas para modificar esse quadro.
SEPPIR, Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, precisam traduzir essas e
outras autoras e divulgá-las amplamente. A sugestão, há tempos, foi feita.
Resta realizar!
Esse post faz parte da Blogagem Coletiva Mulher Negra blogagemcoletivamulhernegra.wordpress.com
Comentários
Cabe a nós reescrever e também por que não?! Pesquisar e trazer à tona essas e outras escritoras.
Obrigada e tudo de bom para ti.
Abraço!