Quanto mais mundo na vida da gente, melhor!
Por Cidinha da Silva
Ai, Manoel, salva-me! Atira um bote,
que o desespero me traga. Apreendida a lição da faca, a delicadeza não veio
abrir a manhã. Ensina-me um assobio para
chamar de volta o azul do azul. Dá-me um concerto de beija-flores para solfejar
meu céu.
Quanto mais mundo na vida da gente, melhor. O shortinho e
o salto no posto (saudade da Lady Zu) são os mesmos da Central do Brasil no
sábado pela manhã, quando sentadinho na plataforma, no contra-fluxo, rumo ao
teleférico do Alemão, você aguarda que os trens despejem o subúrbio na cidade. Elas
vêm de bota plataforma, com alguma purpurina, porque não querem saber de seu
ninguém que disse que sol é o astro-rei e deve brilhar sozinho. E você, sentado
no banco vazio, com os braços abertos no espaldar e as pernas cruzadas, vestido
decentemente, como manda o manual do turista visitante do Alemão pelos ares,
verá desfilar sob seus olhos, boca e nariz, uma profusão de shorts iguaizinhos
ao do posto, com conteúdo diferente do short da moça do posto, é bem verdade.
Mas a vida é mesmo assim, tivessem elas a mesma forma de deusas e estariam
expostas no posto, não seriam descarregadas na Central para ganhar a vida no
Rio ou fazer compras no Saara.
Você, no exercício etnográfico diário, se perguntará como
aqueles shorts entram naquelas mulheres?!. Como sairão sem tesoura? E se assustará
com a capacidade elástica dos delicados corselets
dos 18, em senhoras de 25, 28, 32 e 35. E se você for às compras for às compras na litorânea Santos, num sábado de manhã, dia de mulher casada e
honesta exibir o maridão entre as gôndolas do super-mercado, encontrará homens
de bermuda, camiseta regata ou do time de futebol favorito, ou o time da moda,
quem sabe, as sandálias virais do momento ou tênis. As mulheres estarão de saia
ou vestido (precisam afirmar o tal feminino), blusa de alcinha ou algum decote
que deixe o colo à mostra e maquiagem, complemento in-dis-pen-sá-vel para o dia
ensolarado. Conclusão: cada uma tem o posto de gasolina, a Central do Brasil ou
o super-mercado que merece para exposição da própria figura.
Ai minha Mãe, socorra-me! Tanta ignorãça me devasta.
Abrasa de entendimento o peito.
Imanta as grandezas do ínfimo. Traz de volta as asas para
correr no chão da roça e dar um abraço sem fim na mãezinha querida. Preta e
linda como a rainha que me fez chorar no trem de Madureira, com quem troquei um
sorriso de acalanto.
Um poço fundo dos saberes que me negaram, esconde-se
nesse corpo-cachoeira, onde o frentista do posto, o patrão, o playboy
motoqueiro, os meninos do funk, o irmão-piriguete, todo mundo quer se afogar. Mas
eu agora existo, tenho certidão de nascimento, me matriculei na escola, assinei
meu nome e aprenderei a ler. Tenho família, eu ganhei uma família que me
recebeu como dádiva da espiritualidade. Tenho casa e quero voltar para ela
depois do trabalho e ser rainha aclamada no baile, antes de despertar para mais
um dia de gata-borralheira do subúrbio, sempre feliz, que minha santinha
protetora não deixa faltar a alegria.
E te peço meu pai, se eu não tiver nada a dizer, calai
minha voz. Dá-me o silêncio de tuas pedras. Serena o grito burro dos que não
querem perder os anéis! Eu, guardador de águas, inda não aprendi a ser rio.
Do blog
Mulher 7 por 7:
Os
shortinhos das frentistas nos postos de gasolina do Rio de Janeiro continuarão
firmes, fortes e curtos como sempre, se depender da opinião do governador
Sergio Cabral. “Eu acho que isso não é assunto de governo. É intromissão demais
na vida dos outros!!”, disse, enfático, ao Mulher 7×7.
O novo
projeto de lei, da deputada Inês Pandeló, foi divulgado ontem. Ele proíbe a
exibição do corpo de funcionários (mais funcionárias, bem entendido). A
deputada está convencida de que os estabelecimentos comerciais de modo geral
impõem às mulheres expor o corpo para atrair a clientela. Seria uma espécie de
chamariz erótico, nada inocente.
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