Sobre o livro Olhares diversos – narrativas lésbicas
Finalizei a leitura de “Olhares diversos – narrativas lésbicas”, livro-resultado de concurso literário promovido pela ONG carioca Coisa de Mulher. Numa avaliação honesta, não posso dizer propriamente que gostei. Reconheço a necessidade do livro, a pertinência das abordagens – para utilizar um termo incomum no meu vocabulário -, o clamor interno e externo por textos em que se possa dizer o nome do amor lésbico, em que se faça amor, o amor lésbico, com todas as letras, gostos, signos e dengos. Reconheço a pertinência (outra vez) desta linguagem, o imperativo ético de produzir espaço e legitimação para o amor contado naquelas histórias, entretanto, a forma literária seria condição fundamental, pois o edital falava em concurso literário. Inscrevi o meu “Pela mão de Benguela” nessa perspectiva, li o livro com esta expectativa, encontrei alguns textos bem escritos e cuidados, mas a tônica são relatos explícitos de aspectos quase sempre interditos da vida e dos amores lésbicos, o que, por si só, não os transforma em textos literários. Ah... falemos de amor, façamos amor, mas também literatura. Foi constrangedor, durante a premiação, o discurso de uma autora classificada (como eu) entre as dez primeiras, ao prognosticar que as mulheres presentes ficariam frustradas por ela não ser lésbica. Ora, não se tratava de um concurso para autoras lésbicas, mas para escritoras que escrevessem (para este concurso) contos lésbicos, ou seja, contos que tivessem temática lésbica. Mas, talvez a autora tivesse certa razão, haja vista que a maioria das autoras quis manter anonimato no momento da publicação, mantiveram o pseudônimo. Quiçá a extenuante simbiose entre autoras e obras, sem mediação da forma literária, não lhes tenha permitido revelar a identidade, ou mesmo o medo declarado de algumas que preferiram não fazê-lo, por não serem lésbicas (PASMEM!), mas temerem ser taxadas como tais, caso alguma pessoa conhecida lesse o “tipo” de texto escrito por elas. Ao meu texto, especificamente, foi feita referência incômoda na apresentação do livro. Pareceu-me uma leitura apressada dizerem que nele “mulheres negras movimentam-se dentro da cena, ajudando duas mulheres brancas a viverem uma grande paixão. Embora, as personagens negras transitem no espaço ficcional do conto, se constituindo como indispensáveis ao enredo, a história de amor não está centrada nas duas. São coadjuvantes de uma história amorosa, não são elas as duas amantes”. Ora, “Pela mão de Benguela” não tem qualquer grande paixão entre duas mulheres, há um amorzinho leve, adolescente, ingênuo até, entre duas adolescentes ou jovens-adultas, se quiserem. Grande paixão não há e não se trata de interpretar desta forma ou de outra, mas de dominar algumas definições. O mais não vou discutir, porque aí se trata de interpretação da qual discordo. Queria apenas mencionar esta leitura apressada e talvez contaminada pelas “grandes paixões” vividas na maioria dos contos do livro.
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