Por quê eu sou Galo?
Por Márcia Maria Cruz
Há um tempo ensaio escrever esse texto. Minha mãe, que é a pessoa que mais amo neste mundo, não é Galo. Logo, não foi algo que herdei, como de maneira linda muito de meus amigos o fizeram. Mas arrisco a dizer que nasci Galo, porque nunca foi uma escolha, é uma predestinação. Se um anjo torto disse a Drummond: "vai ser gauche na vida". Um outro desses peraltas me disse: "vai ser Galo, Márcia".
Aprendi muito cedo que para ser Galo era preciso lutar e essa certeza forjou meu espírito. Lapidou meu entendimento sobre futebol. Por uma escolha emocional, era contrária àqueles que viam, nas quatro linhas, o resultado de um cálculo certo. A paixão atleticana se tornava algo intangível, que não tinha correspondência matemática.
Quantificar o sentimento de um atleticano só com a métrica de Roberto Drummond: os versos. Mas para quem a poesia não basta. Recorro a Teoria da Relatividade para explicar essa paixão. O tempo se funde: acreditamos tanto que rompemos a barreira da realidade. Fez-se o sonho! Nosso coração viajou à velocidade da luz e, de repente, estávamos em um universo alvinegro.
"Caiu no Horto, tá morto", "Eu acredito", "Yes, We CAM". Apostamos na mística. Como não acreditar se tudo mostrava que essa taça seria nossa? Ano 2013. Se Zagalo fosse atleticano saberia porquê 13 não é número de azar. 13 é Galo! E até o santo papa, que foi fotografado com a camisa do Galo, alimentou nossa esperança: Papa Francisco são 13 letras.
O goleiro é o único que pode tocar na bola com as mãos, mas foi com o pé esquerdo que Victor virou santo. Vi alguém escrevendo que o destino não seria tão leviano a ponto de não conceder ao campeão tamanha sorte.
Mas o meu amor não é completamente metafísico. Ele se materializa no amor de meus amigos atleticanos. Lembro me como se fosse agora. Ronaldo Balbino prometeu fazer 13 horas de churrasco em praça pública para o Galo não ser rebaixado. E fez! Uma das coisas mais legais que retrato no meu livro "Morro do Papagaio". O casamento de minha amiga Isabella Tavares, em Brasília, no meio da festa entre homens de terno e mulheres de vestido longo, o hino do Galo entoado: Clube Atlético Mineiro. Galo forte, vingador! O cartunista CAu Gomez, que me acolheu quando fui fazer parte do mestrado em Salvador, foi com quem compartilhei a alegria assistir às partidas do Galo na segunda divisão!
Mas não para por aí. Jogo após jogo, a gente se reconhecia nos olhares de solidariedade: se era uma derrota, seguíamos firmes frente aos escárnios. Batíamos no peito e dizia: Aqui é Galo! E foi nas derrotas que meu sentimento ganhou corpo. Foi neste momento que entendi o que era ser Galo! 'Torcer contra o vento se houvesse uma bandeira hasteada', ensinou Roberto Drummond! Mas as derrota não nos calava. Nunca um resultado ruim nos calou.
Aprendemos a venerar Reinaldo, Dadá Maravilha, Marques, Éder! O meu favorito era Toninho Cerezo, que muitos diziam ser a cara do meu pai. Então, chegou Ronaldinho Gaúcho, um cara que há muito eu gostava pelo jeito alegre. Nunca entendi a empatia que tinha pelo Gaúcho, que chegou aqui sob críticas.
Confesso que tive dúvida da contratação, mas o jeito de Gaúcho se sobrepôs a qualquer desconfiança. A cada partida, ele me fazia entender o que era o futebol. Os seus lançamentos geniais me davam ideia de tempo e espaço e como em um doutorado futebolístico mostrava o que poderia ser feito dentro das quatro linhas. Passei a assistir aos jogos dos adversários para saber se poderiam ou não vencer o Galo! Consultava com minhas amigas Tetê Monteiro e Kelen Almeida sobre os esquemas táticos e para saber quais eram as nossas reais chances. Mário Henrique Caixa virou vício.
Confesso que meu coração se fortalecia frente ao escárnio dos que insistiam em dizer que não éramos nada. Uma certeza crescia: prefiro não ter título nenhum a torcer de forma pragmática e arrogante. Não, o meu Galão da Massa é diferente. Não precisava vencer todas para amá-lo. E a torcida mostrava isso, gritando: "Aqui é Galo!" Contra os prognósticos de muitos comentaristas de futebol, que desmereceram o Cuca e o elenco, o Galo avançava. Sob a generosidade daquele que fora duas vezes o melhor do mundo, outras estrelas começaram a brilhar. Jô, Bernard, Réver, Rosinei, Tardelli, Pierre, Leonardo Silva, São Victor! Mesmo com o Galo dando show, o escárnio permanecia, mas a torcida não arredava um centímetro a confiança.
Dizem que no futebol é assim: a rivalidade se sobrepõe a tudo. Então, a cada possibilidade de derrota do Galo, ouvimos e aguentamos os descrentes. Temos tantos títulos, tantas Libertadores, tanto, tanto, tanto... Mas nada disso era maior que o nosso Galão da Massa. Quando Ronaldinho entrou em campo com Dona Guilhermina foi dos momentos mais bonitos, que não irão sair da minha memória. Pelo histórico de Ronaldinho, ele deveria ser aclamado e a massa não se fez de rogada e o incensou ao posto de ídolo. O choro de Ronaldinho, ontem, ao falar desse campeonato me representa! Fico feliz pelo fato de o Galo ter vencido com esse elenco e mais ainda nas circunstâncias que ganhamos! Um beijo nessa equipe e um beijo nessa torcida.
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