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Vejo algumas pessoas tão felizes quando voltam. Eu não tenho para onde voltar. Sei de onde saí, mas não tenho para onde voltar. Minhas viagens são como as de João Cabral, para encontrar o meu mundo. Para chegar ao meu interior. A volta pode ser para qualquer lugar, onde haja um amor e a família fique próxima, ao alcance da mão para visitar. Os amigos estão mesmo espalhados pelo mundo, nunca estiveram concentrados em um só lugar. Deve ser por isso que a cidade não é um tema para minha narrativa. As pessoas vivendo nas cidades, os cotidianos que cada cidade engendra, um certo jeito de olhar o mundo a partir de um lugar, isso me fascina. Mas a geografia das cidades, os lugares da urbes, os temas políticos da cidade X ou Y, isso não me dá tesão. Pelo menos assim como seduziram Lima Barreto, João do Rio e Antonio Maria. Tá certo que eles nasceram e, ou, viveram no Rio de Janeiro, cidade de singular beleza, capital da República, em períodos de intensa transformação histórica e social. Eram homens. Da noite e da boemia, características da cidade. Diferentes de Raquel que escreveu sobre o dia, o sol, a seca. Sobre viagens de barco pelo São Francisco, do Nordeste até o Rio de Janeiro, passando por Minas Gerais. A cidade para mim não é um personagem, o Estado talvez o seja mais. Acho que o Estado propicia mais estados de espírito do que as cidades. Elas te forçam mais a ser. Por exemplo, eu, mineira que sou, profundamente ligada à minha terra e a um jeito mineiro de ser, sou formatada pela cidade de São Paulo. Depois de tantos anos vivendo ali, vejo-me com preconceitos regionais com o ritmo (aos olhos dos paulistanos, mais lento) de pessoas de outros lugares do país. E são essas pessoas que constituem a São Paulo, que as obriga a ter o suposto ritmo rápido dos paulistanos. Quando dei meu primeiro livro ao Ignácio e ele leu em voz alta que eu era mineira de Belo Horizonte, um amigo dele disse: “ah... então a Adélia tem razão. Não é necessário sair de uma cidade do interior para publicar”? O Ignácio iniciou um papo sobre a política editorial no Brasil e minha vontade era dizer a ele: “ser da interiorana Belo Horizonte é diferente de ser de Divinópolis. Em Divinópolis você pode ser você mesma com mais leveza. É mais fácil sair do seu interior, sem deixar a cidade. Belo Horizonte é minha Araraquara. É meu trem fantasma. Talvez, por isso, eu não crie raízes com os lugares, mas com as pessoas.

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