Cronista analógica de um tempo digital
Por Cidinha da Silva*
Por Cidinha da Silva
A poeta Lívia Natália atribui a Tempo, divindade do Panteão Africano, a paternidade de minhas crônicas. Mas lembra que elas também flertam com Cronos, o imperador grego do tempo. É cortesã de muitos amores.
Ao campo de Cronos caberia o efêmero, o circunstancial, o acontecimento datado e refletido em um texto-retrato.
À seara de Tempo estariam ligados o ir e vir, o devir, as curvas. A dança da memória. As encruzilhadas das descobertas e dos saberes.
Minha escrita, embora ágil, tem o raciocínio analógico do cágado que acompanha com os olhos a velocidade do touch screen, suas armadilhas e recalques. Meu raciocínio analógico quer decodificá-los, subvertê-los, deles fazer troça. Tal qual presa que surpreende o caçador pelas costas.
A crônica é assim um jogo de inversões que atribui valor e sentido a aspectos desprezados, ignorados ou pouco perceptíveis do cotidiano. E a tudo ou a quase tudo empresta um pouco de graça, poesia, ironia, amor. Tudo junto e misturado ou em laivos surpreendentes de lirismo, humor e acidez. Via conta-gotas ou em doses cavalares. Tudo a depender do calor do acontecimento, da necessidade homeopática e dos humores ou calundus da cronista.
A crônica é um retrato do momento, do sentimento, do pensamento, da reflexão. É grito ou murmúrio, clareira ensolarada ou porão cheio de bichos rastejantes e sonolentos, escondidos pelos cantos. Corte fino de adaga, precisão de cutelo.
E se é verdade que o romance ganha o leitor por pontos e o conto por nocaute, a crônica esgrima e vence por W.O.
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