Deixem Neymar chorar em paz!
Por Cidinha da Silva
Chorar quando você tem
vontade é uma conquista. Nem todo mundo depois de grande consegue fazê-lo. Neymar
nem é chorão, mas foi só derramar umas lágrimas e os patrulheiros acenderam os
faróis.
As lágrimas de crocodilo
são fáceis de detectar: As de Feliciano franzindo a testa e apertando os olhos
para ajudá-las a cair, enquanto acolhe Marina Silva no ombro são exemplares.
O choro dela, por sua
vez, é mais difícil de categorizar porque a conhecemos, pelo menos a
conhecíamos, ela nos representava e talvez, em nome disso, pensemos na
possibilidade de que suas lágrimas digam “meu Deus, o que estou fazendo da minha vida?”
As lágrimas do ex-goleiro
Bruno, de Bola e Macarrão, comparsas no assassinato de Elisa Samúdio, prévias à
decisão do júri, são crocodilagem grosseira que não iludem a ninguém. Se Ivone
Maggi destilar lágrimas de sangue também não nos enganaremos. Saberemos
identificá-las como chororô pela perda de posições de poder, de privilégios.
As lágrimas de Neymar,
considerado o maior jogador do Brasil e das Américas em atividade, ao partir
para a Europa, feliz, bem sucedido, menino que realiza sonho de menino, de
tantos meninos não tão bons quanto ele, sonho de jogar no Barcelona, me parecem
tão humanas e compreensíveis. Neymar carrega a esperança de fazer ressurgir o Barcelona
de Messi, de Ronaldinho, o maior entre os melhores. Você não choraria?
Talvez, não. Chorar de
alegria, de contentamento, diante do grande dia, da grande água, do imenso
horizonte, é dádiva para poucos. O choro legitimado é o da culpa, da dor, do
desespero, da revolta, da mágoa, da tristeza e Neymar pode ter chorado ao se
despedir do Brasil, dos campos que o consagraram, dos companheiros, da torcida
que o idolatra, do colo dos que o amam, porque mesmo sendo um jovem vitorioso,
realizador de sonhos, inspiração para tantos sonhos e para tantos jovens e
crianças, deve sentir medo do desconhecido, de não encontrar lá fora todo o
amor, conforto e reconhecimento desfrutados por aqui.
Mesmo intrigada com a
amargura que leva tantos a crucificá-lo, compreendo a frustração de ver as
lágrimas de Neymar dominando a mídia, em detrimento de assuntos sérios e
candentes. Para mim não seria motivo de descontentamento caso fossem abordadas com a profundidade merecida.
A lágrima é palavra
abafada que escapa quando a maré dos olhos vaza e nos derrama pela face
proteínas, sais minerais e gordura que lubrificam e limpam os olhos, retiram
véus, diminuem nossa acidez.
Diante de tanta gente que
na supermodernidade chora desesperada quando o celular não toca convidando para
a comunicação vazia e intermitente dos viciados no uso do aparelho, eu me
enterneço quando o canto de um passarinho depois da tempestade faz alguém chorar.
E enquanto as lágrimas comuns
engrossam o temporal destes tempos, o pássaro das alegrias de Neymar escolhe
lugar para o ninho. Voa, menino, voa!
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Avanir Carvalho Pontes (FEMNegras)