125 Anos de abolição e eles gritam mais uma vez que o poder é branco!
Por Cidinha da Silva
Um juiz do Maranhão conseguiu
suspender na Justiça Federal os editais da FUNARTE/MinC destinados a artistas e
produtores culturais negros. O fato é tão surreal que as pessoas duvidam da
seriedade da notícia. Não seria trote como a nota de suspensão abrupta do
Bolsa-família plantada na mídia?
Às vezes tenho medo do país em
que vivo. Temo por meus mais-novos. Fico escandalizada com a incúria da
branquitude que não dá trégua, não larga o osso, não admite perder milímetros,
gotas, milésimos de seus privilégios arraigados.
O Brasil real, branco e racista,
quando se manifesta é tão virulento que produz certa apoplexia. Ele se organiza
à revelia da legislação, da constitucionalidade das ações afirmativas, das
decisões do STF e rasteja circularmente pelo assoalho da casa grande. Ele
desconsidera tudo e todos em nome dos próprios interesses egoístas,
autoritários, desumanos, dos privilégios quase de casta. Ele se regozija em
afirmar que se não for do jeito dele e se não for tudo para usufruto dele, não
será de mais ninguém.
Esse Brasil tem milhões de
defensores, uns mais empedernidos, outros menos. Gente que se locupleta da
arbitrariedade vil, pronta a argumentar que tudo deve ser de todos e para
todos, leia-se, dos brancos e para os brancos que sempre tiveram tudo. E essa,
no entendimento deles, é a ordem natural das coisas. E que os negros continuem
nos seus lugares, domesticados.
Quando esse Brasil percebe que os
negros estão se organizando, conquistando umas coisinhas poucas, tratam logo de
contra-atacar com os instrumentos bélicos adequados a cada momento. Seja no
capítulo de novela das nove no dia 20 de novembro, em que uma personagem branca
dá uma bofetada na protagonista negra que lhe pede perdão de joelhos por
sentir-se responsável pelo acidente que deixara a filha da mulher branca
tetraplégica, seja noutra novela, na qual um homem negro chamado Pescoço cai
nas graças do povo pelo jeitão encostado, explorador de mulheres, somado ao
racismo internalizado. É Pescoço, mas poderia ser joelho, cotovelo, calosidade,
qualquer coisa, qualquer nota. Seja na decisão da Justiça Federal de suspender
os editais de ação afirmativa da FUNARTE/MinC destinados a artistas e
produtores culturais negros, em atendimento ao reclame de um juiz qualquer que
resolve obstar a vida e os sonhos de mais de dois mil proponentes negros.
Esse Brasil se levanta e vocifera
que o poder é branco e continuará a sê-lo! E nós o encaramos nos olhos e
prosseguimos. Embora por vezes pareça meta inatingível, é só questão de tempo
para que o Brasil negro diga ao Brasil branco e racista: Perdeu playboy,
perdeu!
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