Sobre o sono dos cavalos e o transporte público em São Paulo
Por Cidinha da Silva
Você aprendeu na escolinha que cavalos e outros quadrúpedes dormem em pé, ou pelo menos tiram uma soneca, não foi? Pois pegue o metrô em São Paulo, da Zona Leste para o Centro, antes das 7:30 da manhã, e você verá vários bípedes humanos dormindo nessa posição.
Você se perguntará como é possível, mas em questão de segundos, perceberá que ninguém cai. Uma pessoa escora a outra, não protege, mas escora, tal qual bois e vacas no caminhão sacolejante a caminho do matadouro.
Mas, espere, ao invés de propor um projeto de pesquisa baseado na observação etnográfica do quadro a seus alunos na universidade, aproveite esta narrativa insólita para compreender porque é tão aviltante acrescentar 40 centavos diários ao que essas pessoas pagam para serem transportadas como animais maltratados rumo a um dia extenuante de trabalho, e também depois para voltar à casa.
São pessoas que dormem em pé no metrô porque chegam onde moram sobressaltadas pelo risco de serem abatidas pela polícia ou por milícias atuantes na quebrada, porque não sabem se encontrarão os filhos vivos, porque disputam um lugar na aglomeração pacífica tolerada pelas autoridades para entrar no metrô e viajar de pé. Dormiram cansadas na noite anterior (dormem assim todos os dias), acordaram cansadas e não sabem quando terão paz para descansar o suficiente.
No dia em que o trem pára e sempre que chove isso acontece, um trabalhador ou trabalhadora pode levar até 4 horas (usualmente são 2:30) para deslocar-se do Centro à casa, em São Miguel Paulista, que, é longe, mas ainda é mais perto do mundo conhecido do que o Pantanal, bairro da mesma região Leste, no qual reside a família do ciclista que teve o braço arrancado por motorista criminoso na Paulista.
As paradas do trem por tempo indeterminado podem acontecer também em dias secos e, nestes, você poderá ver hordas de usuários do transporte público, de todas as idades, caminhando como formigas em fila pela linha do trem.
Não é mentira da cronista, fantasia ou metáfora. Haverá também quebra-quebra feito pelo setor mais revoltado do grupo, ao terminar o trajeto forçado a pé sobre o cascalho da linha férrea.
Para você que, além de curiosidades sobre o sono dos cavalos, aprecia cinema, este não é um mundo de replicantes. Estas pessoas não são baratas. São tratadas como se o fossem, mas não o são, é bom avisar, Just in case!
Na vida de gado real e cotidiana desses seres humanos, qualquer vintém acrescido ao valor do transporte de todo dia é inaceitável.
Na prática, mulheres e homens trabalhadores, estudantes, pessoas que circulam pela urbes são constrangidos a pagar mais pela ração diária de maus tratos.
Aceitar passivamente o aumento do valor pago por esse tipo de transporte público, mesmo abaixo da inflação acumulada, como propugna o prefeito, é apertar o fecho da coleira de rebaixamento da condição humana no pescoço.
Você aprendeu na escolinha que cavalos e outros quadrúpedes dormem em pé, ou pelo menos tiram uma soneca, não foi? Pois pegue o metrô em São Paulo, da Zona Leste para o Centro, antes das 7:30 da manhã, e você verá vários bípedes humanos dormindo nessa posição.
Você se perguntará como é possível, mas em questão de segundos, perceberá que ninguém cai. Uma pessoa escora a outra, não protege, mas escora, tal qual bois e vacas no caminhão sacolejante a caminho do matadouro.
Mas, espere, ao invés de propor um projeto de pesquisa baseado na observação etnográfica do quadro a seus alunos na universidade, aproveite esta narrativa insólita para compreender porque é tão aviltante acrescentar 40 centavos diários ao que essas pessoas pagam para serem transportadas como animais maltratados rumo a um dia extenuante de trabalho, e também depois para voltar à casa.
São pessoas que dormem em pé no metrô porque chegam onde moram sobressaltadas pelo risco de serem abatidas pela polícia ou por milícias atuantes na quebrada, porque não sabem se encontrarão os filhos vivos, porque disputam um lugar na aglomeração pacífica tolerada pelas autoridades para entrar no metrô e viajar de pé. Dormiram cansadas na noite anterior (dormem assim todos os dias), acordaram cansadas e não sabem quando terão paz para descansar o suficiente.
No dia em que o trem pára e sempre que chove isso acontece, um trabalhador ou trabalhadora pode levar até 4 horas (usualmente são 2:30) para deslocar-se do Centro à casa, em São Miguel Paulista, que, é longe, mas ainda é mais perto do mundo conhecido do que o Pantanal, bairro da mesma região Leste, no qual reside a família do ciclista que teve o braço arrancado por motorista criminoso na Paulista.
As paradas do trem por tempo indeterminado podem acontecer também em dias secos e, nestes, você poderá ver hordas de usuários do transporte público, de todas as idades, caminhando como formigas em fila pela linha do trem.
Não é mentira da cronista, fantasia ou metáfora. Haverá também quebra-quebra feito pelo setor mais revoltado do grupo, ao terminar o trajeto forçado a pé sobre o cascalho da linha férrea.
Para você que, além de curiosidades sobre o sono dos cavalos, aprecia cinema, este não é um mundo de replicantes. Estas pessoas não são baratas. São tratadas como se o fossem, mas não o são, é bom avisar, Just in case!
Na vida de gado real e cotidiana desses seres humanos, qualquer vintém acrescido ao valor do transporte de todo dia é inaceitável.
Na prática, mulheres e homens trabalhadores, estudantes, pessoas que circulam pela urbes são constrangidos a pagar mais pela ração diária de maus tratos.
Aceitar passivamente o aumento do valor pago por esse tipo de transporte público, mesmo abaixo da inflação acumulada, como propugna o prefeito, é apertar o fecho da coleira de rebaixamento da condição humana no pescoço.
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