O dia em que Willian Bonner chorou
Por Cidinha da Silva
O Jornal Nacional aproximava-se do fim e seguindo o roteiro diário viria algo de impacto para encerrar a
espetacularização da notícia no horário de maior audiência dos telejornais.
O narrador de voz bonita, terno
impecável e cabelos charmosamente grisalhos anuncia um caso surpreendente no sertão
do Brasil.
Um adolescente de vida miserável é flagrado ao roubar um bombom na vendinha da
região. A repórter responsável pela cobertura percebe que ali há uma boa
história para entreter os telespectadores fiéis e resolve levar a notícia do
roubo à mãe do garoto para compor o drama que antecipará a novela das nove.
O cinegrafista, depois de ter
filmado o menino cabisbaixo e mudo na delegacia, inclui as devidas tarjas no
rosto, pois o pequeno infrator tem apenas 13 anos, fecha dramaticamente o ângulo
da câmera no bombom solitário sobre a mesa do delegado e, junto com a repórter,
ruma para a casa daquela que roubaria a cena e emocionaria o apresentador, a
mãe do menino.
No trajeto a câmera destaca os
efeitos da seca prolongada, a pobreza, o abandono. Quando chegam à casa,
cumprimentam a dona, são convidados a entrar. A repórter senta em um dos dois
tocos da casa de cômodo único, cruza as pernas, equilibra-se. A mãe senta na
cama de forquilha, dois troncos finos de árvore que sustentam colchão velho,
fino e torto, cama única do lugar. Afora isso, uma bilha com caneca de alumínio
em cima, dessas de escola pública, e retrato de um casal na parede, o homem de
terno, a mulher de vestido branco, provável casamento dos pais do menino.
A repórter, compungida, transmite
à mãe a notícia do roubo. Lágrimas grossas escorrem pelos sulcos do rosto
marcado pelo sol e pela dureza no trabalho da roça. A Câmera focaliza cada
detalhe. A mulher ergue o dedo cabeçudo e calejado, sem unha feita, esfolado
pelo cabo da enxada e profetiza: “Eu vou falar uma coisa pra senhora, ele
roubou foi de safadeza, colegage, luxúra. Não foi fome, não senhora, porque fome
ele conhece desde que nasceu!”
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