Mano Brown: mil faces de um homem leal!



Por Cidinha da Silva

O título da crônica é o mesmo da entrevista, muito feliz, aliás. O mais novo, novo, novo, três vezes o mais novo da nova cena, assim Mano Brown se define. Um homem com metódica rotina de trabalho, taurino que se reconhece no leão, rei, guerreiro. Insiste na criação durante o cotidiano do trabalho, longe da inspiração, da iluminação, como muita gente acha.

Brown não dá mais direção religiosa a ninguém. Já deu, mas acha isso um erro. Tem 42 anos, é, portanto, da minha geração e gosto de acompanhar o que pensam meus pares, mesmo que sejam ímpares em muitas coisas. No caso de Brown, somos divergentes  no tratamento dado às mulheres e às orientações sexuais distintas da heterossexual, além da opinião sobre o crime organizado. Acho incrível, realmente, inacreditável, que um homem tão importante, passe páginas e páginas de conversa sem nominar as mulheres basilares de sua vida. Há menções pontuais à mãe e à esposa, o comum do comum, o clichê do clichê. Afora isso, só a Presidenta Dilma, no momento de afirmação das mudanças fundamentais processadas no Brasil, nos últimos 24 anos.

Gostei de saber um pouco sobre o processo criativo do cara, suas idéias sobre música, arte, composição. A entrevista bem conduzida da Rap Nacional foge da mesmice dos aspectos militantes do Rap. Mano Brown é músico, compositor do time dos grandes e assim é abordado, ou, dirige a entrevista para este lugar.

Sobre questionamentos ultrapassados que o incomodam, declara: “para quem não sabe o Racionais sempre foi um grupo que prezou pela liberdade de escolha, de ritmo, de som, de roupa, de capa, de nome de disco.” E ele, em especial, sempre gostou de movimentar-se no sentido contrários das expectativas, para surpreender.

A leitura me apresentou um artista muito crítico do próprio trabalho, lúcido e exigente.  Que lindo e confortante ouvir Brown afirmar que a pior coisa criada por ele foi o estigma marrento (de radical, ignorante, às vezes) e não se furtar às responsabilidades dessa criação. Crítico também em relação ao Hip Hop – “o nosso movimento virou um movimento jovem conservador, isso tem que mudar.”

Todo visionário precisa (re) conhecer o passado e não é diferente com Brown: “o final dos anos 80 (quando o Racionais surgiu) era outro mundo, passaram-se 24 anos. A dívida externa não tinha sido paga, não tinha Lula na Presidência, não tinha metrô no Capão, Obama nos EUA, não tinha mulher Presidente do Brasil, nem asfalto na quebrada. Não tem como esticar o chiclete por 25 anos falando as mesmas coisas como se elas não tivessem mudado.”

E Brown tem opinião sobre temas múltiplos: a quebrada, a violência, a polícia, a ausência do Estado, o crime organizado como algo revolucionário, liderança política, sobre o que uma pessoa é, e sobre o que aparenta ser, sobre a mídia, sobre os incêndios nas favelas de São Paulo, sobre embargo político ao rap e ao funk, sobre tristeza e alegria.

Para finalizar, o Brown que a todos intimida define Sabotage e me lembrou Pastinha mimando a capoeira, como uma coisa amorosa: “o Sabotage era um rapper carinhoso, ele é o Rap. Uma vez, a gente conversando, eu falei em tom de brincadeira, eu escrevo rap, o Edi Rock canta rap e o Blue é o rap. Eu acho que Sabotage é o rap. Ele era o rap de carne e osso.”

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