Sobre clubes, igrejinhas e assemelhados!
Por Cidinha da Silva
Só compreendo a ausência de Grace Passô de uma programação como a de Nova
Dramaturgia da Melanina Acentuada por dois motivos: primeiro, caso convidada, Grace,
estrela singular na geração balzaquiana de dramaturgos e diretores brasileiros,
não tenha se interessado em participar. Segundo, se, interessada, tenha faltado
espaço na agenda. Afora isso, qualquer outra justificativa para esta lacuna é
cabotina!
É a mesma lógica
para aceitar a ausência de Ricardo Aleixo e Elisa Lucinda da Antologia
Literatura e Afrodescendência (UFMG, 2011). Só o desejo deles de
não-participação é plausível.
As igrejinhas
não estão restritas ao velho eixo conhecido. Construímos nosso próprio nicho à
margem do eixo. Um proto-eixo, digamos. E enquanto não houver respeito e
reconhecimento pelo fazer artístico da outra pessoa, a despeito de que ele seja
maior que o nosso, e/ou divergente dele, editaremos mais do mesmo (aqui a
expressão é mais do que um clichê) e o travestiremos do novo.
Um exemplo?
Outro dia, enquanto trabalhava com um grupo de jovens artistas negras, uma
delas leu para o coletivo, indignada, um e-mail apressado que dizia mais ou
menos assim: “oi fulanas, tudo bem? Estou com uma ótima oportunidade de
trabalho para vocês se apresentarem com o espetáculo do avestruz, preciso dos
contatos de vocês.” Ao que minha colega respondeu: “obrigada pelo contato, mas
parece que sua cabeça está dentro do buraco e você atirou a esmo, errou o alvo.
É outro, o grupo de artistas negras (muito bom, por sinal) que encena o espetáculo
do avestruz. O nosso é um trabalho sobre poemas de um autor negro dos anos
50/60.”
Insistimos em
criar clubinhos, sempre! E temos o direito de fazê-lo, por suposto. Contudo,
não pega bem esse proceder, quando trabalhamos com dinheiro público e
pretendemos a construção de mostras abrangentes. Contudo, não deixa de me
surpreender a solenidade e a desfaçatez aplicadas para ignorar a produção das
mulheres. Mesmo conhecedora deste quadro, se você não sabe quem é Grace Passô,
lamento! Procure saber!
Foto: Grace Passô. Atriz, diretora e
dramaturga. A artista já foi premiada com um Shell de Teatro (2006) e um prêmio
da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) (2005) pelo texto de
"Por Elise", montagem da qual é atriz, diretora e dramaturga. O
espetáculo foi responsável pela criação da companhia Espanca!, parceria dela
com outros quatro atores, em Belo Horizonte. "Por Elise" (2005)
integra a trilogia do grupo, que inclui "Amores Surdos" (2006) e
"Congresso Internacional do Medo" (2008).
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