Uma bisnaga de lança-perfume por uma britadeira? Vai aê?



Por Cidinha da Silva

Acocorada entre três pedreiras estava a moça. Entra no ônibus um vendedor de doces que faz ruir todas as certezas dela sobre a leveza soteropolitana dos ambulantes em coletivos, e certa dureza dos paulistanos.

Senhoras e senhores, ele dizia, não estou aqui para vender nada. Papai do céu me enviou do fundão da zona leste para adoçar a vida de vocês. Eu vou dar uma balinha para cada um (começa a distribuir os presentes), podem pegar sem medo, não é de Cosme e Damião, não. A moça das pedreiras o olha com olhar repreensivo, qual é o problema com Cosme e Damião? Ele parece compreender e conserta: também não é de Jesus, porque eu não sou religioso. Minha clientela é vip, como a do Complexo do Alemão, todo mundo leva bala, de graça. Lá, de calibre 12, na minha mão, de calibre doce. O senhor ali da esquerda, pode pegar a bala sem medo, não dói, nem tá envenenada. Você aí, senhora, pode me olhar com essa cara de vaso, não faz mal. Meu pai é jardineiro, adoro flores.

Assim que termina a distribuição gratuita, o vendedor de balas desenvolve a segunda parte da cena. Agora pessoal, eu vou colocar na mão de vocês, sem nenhum compromisso, um chocolate delicioso. Para as mulheres na TPM é um bálsamo, para a criançada, lambuzação garantida, para os homens uma compensação para o futebol que não vai bem das pernas, mas também uma comemoração para quem, como eu, é do Bando de Loucos. Pode pegar, sem compromisso. A data de validade está na frente, do lado esquerdo. Tudo isso, senhoras e senhores, por apenas um real. Quem comprar um chocolate desses me ajudará muito com as minhas coisas. Que lindo! A moça pensa. Ele deve juntar esse dinheiro para pagar a faculdade. Mas ele completa: vocês me ajudarão a pagar a prestação do meu Escort, escort de água, escort de luz, também do meu Astra, que miséria pouca é bobagem. O Astra das minhas contas astrasadas.

Todo mundo compra, sorrindo. Alguém comenta de lado que no trem é dois por um, o baleiro ta tirando dinheiro dos tontos. Ele finaliza: vamos, vamos pessoal, só um real! No outro ônibus a galera gostou tanto que comprou de quilo e comeu chocolate até com papel. Vocês não vão querer ficar para trás, não é?

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